
Imaginei coisas baseadas nas
propagandas de quem já estudava. Quem estuda no IF parece que vira garoto
propaganda do Instituto: sempre falando das qualidades da estrutura; usa a farda
para ir pro shopping, pro casamento da avó, pro velório do tio; posta no Facebook
o quanto está atarefado com as atividades; compartilha os status dos
amigos que lamentam a falta de tempo e comentam “fato”. Enfim, é uma série de
artifícios que criam uma muralha imaginária de dificuldades pra quem sonha em
estudar no Instituto.
- Você está preparado para começar a
estudar de verdade? – Me questiona uma linda garota de cabelos loiros.
- Na verdade nem sei o que estou
sentindo. Devo estar com um ecossistema no estômago – Não soube discernir se
era o nervosismo da aula, ou de estar perto da garota.
- Fica calmo. O professor nem chegou
ainda.
- Por isso mesmo. Talvez o monstrengo
esteja preparando um algoritmo para iniciar o massacre com os calouros.
- Monstrengo? Espere pra ver o tourão
que é o professor de Eletrônica!
- Ah, que ótimo! – Por mais que ela
falasse em tom irônico, aquilo me parecia tudo verdade.
- Esqueci de perguntar o seu nome.
- Eu tenho cara de quê?
- Felipe, Mário, Pedro, Jorge, não
sei.
O professor estava demorando muito.
Era aula de Programação em plena
segunda-feira no primeiro horário. Tentei imaginar então como seria a aula.
Lembrei de
que, quando andava no ônibus, sempre via algum estudante do IF com uma lista de
500 páginas de exercícios, ou lendo livros volumosos como o de Harry Potter. Pensei então que a aula
seria como um congresso intergaláctico de nerds alienígenas resolvendo
equações das teorias do universo.
- Vou te passar todas as boas
práticas de sobrevivência, tudo bem?
- Acho que você não está me ajudando.
De repente toca para o intervalo e
nada do professor.
No intervalo, deu para respirar. Mas
não por muito tempo. Um sujeito veio se aproximando de mim. Primeiro dia de
aula, sempre tem um pobre coitado carente, tentando fazer amizade.
- Muito bom, hein! A loirinha já tá
na sua!
Ops, me enganei. O guri era gente
boa.
- Que nada. – respondi olhando para
os lados.
- Vamos sair, estão vindo uns
babacas. Eles são de Edificações.
Então
percebi que se existiam “eles”, existia um “nós”, eu e meu amigo. Então isso
fazia de mim um pobre carente também.
- Vou voltar pra sala, vou lanchar
lá. - falei tentando sair de perto dele.
Voltei e sentei novamente no meu
lugar.
A cadeira verde parecia muito
confortável comparada às da minha antiga escola. Ela tinha uns nomes em alto-relevo
que me atentavam para pegar o lápis e rabiscar seus contornos, coisas que
geralmente fazemos quando não botamos a tampa da caneta na boca. No canto
superior direito da mesinha, tinha um suporte arredondado que me fez imaginar
um copo bacana para encaixar ali e poder me hidratar durante as aulas.
- Fez novos amigos? – A loira se
chegava novamente.
- Só um pobre carente, nada mais.
- Ah, que bom!
- O primeiro professor nem veio.
- Que sorte a sua. Programação é boa só de longe, acredite.
Entra velozmente um professor, com um
jeito agoniado, montando as coisas sobre o birô. Camisa verde da Stalker,
óculos, orelhas compridas, sem barba. Tira da bolsa um monte de papéis.
- Se prepara... – diz a loira com
cara de assustada.
- Como assim?
O professor se ergue triunfalmente,
como se fosse apresentar uma peça ao ar livre. Parecia até uma cena em câmera
lenta.
- Vamos, vamos, entrando no clima,
pegando as apostilas, que o conteúdo está delicioso!
A garota vira novamente pra mim.
- Bem-vindo ao IF oficialmente, sua
alegria acaba aqui.
O professor
passa entre as filas entregando uma pilha de folhas, com textos e teorias da
língua portuguesa. Ao passar por mim, percebe que sou novato.
- De onde você é, amiguinho? – Com
uma voz tenuamente doce.
- Sou de Natal. – respondo
desconfiado.
- Natal, mas é claro!
Todos riram
e eu não entendi o motivo. Mais tarde descobri que seria o primeiro de tantos
outros famosos bordões.
Raddson Ricelle
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