Nunca fui de me apegar a
ninguém. Até conhecê-la. Quem diria que eu, um empresário requintado, que tinha
aos meus pés as mais belas damas da elite, me apaixonaria por ela. No início eu
tentava me convencer de que aquilo não estava acontecendo. Mas estava.
Eu simplesmente não sabia o que fazer. Aquilo nunca havia
me acontecido antes. Era como se estivesse partido ao meio e deixado a outra
metade em algum lugar. Mas onde? Tentei preencher esse vazio nos bares, nas
festas e em todos os outros lugares aonde costumava ir quando me sentia assim.
Mas dessa vez não funcionou, nada me fazia sentir completo. O único lugar onde
eu me sentia preenchido era meu escritório. Não pelo trabalho, nem pelo que
havia lá, mas por ela.
Ângela, esse é seu nome. Perfeito nome para a pessoa mais
angelical e doce que já conheci em toda minha vida. Talvez tenha sido esse o
motivo pelo qual me apaixonei por ela.
Todas as manhãs, ao chegar em seu escritório, tão meiga,
tão bela, puxa as cortinas, abre as janelas. Sempre com a mesma delicadeza.
Sempre muito sorridente, trata bem todos os meus clientes.
Nunca tive coragem de contar pra ela o que sinto. Mas
certo dia, conversando com Moreira, um colega de trabalho, comentei que estava
apaixonado por ela. Quando olhei para a porta da sala, lá estava minha doce e
adorável Ângela, que tinha ouvido toda a conversa. Ao notar que eu a tinha
visto, saiu correndo para sua sala. Eu, sem saber o que fazer, fiquei parado, olhando
para Moreira. Ele aconselhou-me que fosse conversar com ela. E assim o fiz.
- Ângela?!
Ela me olhou. Mas nada respondeu.
- Ângela?! – insisti. -Você está bem? – perguntei com voz
trêmula.
-Aquilo que você disse é verdade? – Ela me perguntou sem
olhar para mim. – Por que você nunca me disse nada?
Na verdade, já tentei te falar. Mas tinha medo.
- Medo de quê? – disse ela me olhando
- Do que você poderia pensar. Tinha medo de ser
confundido com um assédio sexual.
Ela, sorrindo, falou:
Também tenho que te contar uma coisa. –baixando a cabeça,
continuou: - Também estou gostando de você.
Sorrimos. Nos aproximamos. Dei-lhe um beijo como aqueles
de meus sonhos.
Dali em diante, passamos a nos encontrar diariamente após
o trabalho. Mas algo me soava estranho, ela sempre ficava assustava quando
saíamos em meu carro. Sempre escolhia os lugares mais discretos e longe de
todos. Evitava ser vista, nunca abria a janela do carro. Cheguei a perguntar o
motivo de ela estar fazendo aquilo. Mas suas respostas não me convenciam.
Até que um dia apareceu, na empresa, um homem gritando completamente
descontrolado:
- Sua vagabunda! Sem vergonha! Eu sei de tudo! Sei quais
serviços você está prestando a seu patrãozinho! Sua vagabunda!
Saí de minha sala para ver o que estava acontecendo. Ele
estava gritando com Ângela. Ela estava chorando.
- Com licença, o que está acontecendo aqui? Quem você acha que é para falar assim com
ela?
- Quem eu sou? Sou o marido dela, ou melhor, ex-marido!
Hoje mesmo trate de ir buscar suas coisas, ou então eu que vou sair de casa.
Fiquei parado. Sem ação alguma. Ela apenas chorava,
cabisbaixa.
-E quem é você? – ele me perguntou.
-Sou o patrão dela – falei.
Ele me deu um soco. Fui ao chão. Ângela se levantou.
Tentou tirar ele de cima de mim, e também foi ao chão. Os seguranças logo
apareceram e o tiraram dali.
Ela se aproximou de mim.
-Você está bem? – perguntou-me.
-Como você pôde fazer isso comigo? Por que você não me
contou?
- Eu ia te contar...
- Quando? – falei alterado. – Saia daqui agora! Não quero
te ver nunca mais!
- Mas, meu amor... – falou chorando.
- Meu amor por você acabou agora. Não quero mais saber de
você. Nunca mais!
Chorando, arrasada, saiu. E eu, novamente incompleto.
Depois deste ocorrido, minha vida nunca mais foi a mesma.
O mundo não tinha mais cor. Era, agora, só escuridão. Não via mais graça em
nada. A vida e a morte eram uma só coisa.
Voltei a frequentar os bares. Tornei-me um alcoólatra. Aos
pouco fui parando de trabalhar, minha empresa estava falindo. Eu estava, cada
vez mais, na lama. Minha família e meus amigos tentaram me alertar, mas eu não
quis enxergar o que estava acontecendo. Fali. Fui morar na rua.
Já não havia mais sentido em viver. Peguei uma faca. No
momento em que eu ia acabar com meu sofrimento, eis que surge Ângela,
suplicando para que eu não me matasse. Nesse instante, percebi que realmente a
amava. E, sem muito esforço, ela me convenceu.
Naquele momento, as cores voltaram a reinar em meu mundo.
E ali, juntos novamente, meu único desejo
era tê-la em meus braços. E assim o fiz. Puxei-a pela mão. Dei-lhe um beijo.
Senti-me realizado como na primeira vez que nossos lábios se tocaram.
Ravena Duarte
Conto produzido a partir da letra da canção brega Secretária, de Amado Batista.
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