segunda-feira, 11 de julho de 2016

Eu não sou ladrão


 É o quê? Eu sou o ladrão? Que ladrão? Eu não roubei a sua bolsa, senhora! Polícia? Senhora, pare! Não fui eu! Por que eu sou o ladrão? Porque eu sou negro? Porque eu uso touca e boné de aba reta? Porque eu não estudei o suficiente como você? Porque eu moro na periferia e a minha vida se torna uma estadia?
Não, eu não sou ladrão!
Não é vitimismo meu dizer que eu sou a vítima da história. Pois é! Eu sou a vítima... De quê? Eu sou a vítima que nunca tive a oportunidade de estudar; a vítima que, pela cor, nunca fui aceito em um trabalho de qualidade; vítima de pessoas, como você, que, pelo motivo de eu ser negro, me trata como bandido; vítima de policiais; vítima do desemprego, da fome, da morte, da desgraça, da rua...
Ei, espera! Por que está me algemando? Eu não roubei nada!
Por que não prendem os caras de ternos, que nos roubam pela fé ou pelo trabalho escravo? Ou então os que nos roubam no Congresso Nacional! É, no Congresso Nacional! Aquele espaço, de homens ricos, brancos, que decidem a nossa vida e me tornam um bandido porque eu quero estudar e ter um trabalho digno.
Para! Você está me machucando! Estou fazendo o que você pede, não vê que eu estou andando?
O que mais me dói é estar gritando pra todo mundo ouvir e ninguém me escuta. Só porque eu sou negro...
Olha essa multidão de gente branca... Socorro! Parem! Um negro não pode andar mais em uma cidade grande?
Eu não sou ladrão!
Mês passado se foram três amigos meus da periferia, semana passada mais dois irmãos meus, hoje sou eu! E amanhã, quem será? Será um rico engravatado? Ou será mais um pobre enterrado, morto por um saldado, morto por ser negro.
Salve, salve, meu pai Ogum! Guerreiro contra a injustiça. Eu espelho essa tua guerrilha. Eu luto contra a desigualdade. Eu mostro a realidade. Negro também é gente...

Ogunhê!

Mikael Lucas

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