segunda-feira, 11 de julho de 2016

Tchau, querida


             Olho no espelho. Ajeito a gola da camisa. Uso a mão para alisar o cabelo. Está tudo pronto.
            Eu vou sair. Tenho um encontro com Mikaelly. A mulher da minha vida. Só nos vimos uma vez. Será a primeira vez que vamos sair. Me apaixonei à primeira vista. Acho que foi recíproco. Ela também deve estar apaixonada...
            Confiro o visual pela última vez. Ligo para avisar que estou saindo. Pego um táxi.
            Chego ao restaurante. Entro. Lá está ela. Linda. Ela continua linda. Cumprimento. A gente come. Bebe. Conversa e se diverte. O tempo passa.
            Na TV, a notícia de que Temer assumiu a presidência. É uma vergonha... O golpe foi realizado. Dizem que é contra a corrupção... “Dilma corrupta”, “Lula ladrão”, “A culpa é do PT”... Eles nem sequer têm argumentos.
            Mikaelly fala. Faz um comentário. Algo como “Finalmente!”.Acho que ouvi errado. Meus ouvidos me enganam. Será? Será que ela é ‘coxinha’?!
            - Dilma cometeu crime. ‘Luladrão’ está sendo desmascarado. Toda a corja está caindo. – Ela completa.
            Não acredito.Ela é ‘coxinha’. Faz críticas ao governo. Chama de corrupto. Ladrão. Desonesto.
            Fico me
perguntando:E quem é honesto!? Cunha? Temer? ‘Bolsovomito’? Como um ato liderado por corruptos pode ser “contra a corrupção”? Como uma mulher pode apoiar um grupo de machistas?
            Faço uma crítica ao processo. Ela se surpreende. Pergunta se sou petista. Claro que sim! Sou a favor da democracia. Das minorias. Com esse golpe jamais concordaria. Dilma não cometeu crime de responsabilidade. Os direitistas não conseguiram vencer a eleição. O povo não os quer no poder. Eles criaram o processo de impeachment para tomar o poder sem passar por uma eleição. Esse golpe não foi só contra o governo. Foi contra o povo. Contra a democracia.
            Ela disse que o PT afundou o país. O Brasil está em “estado de calamidade” por causa do PT. Ela fala como se o Brasil fosse um paraíso antes do governo petista. Como se fosse o paraíso. O meu partido tirou 36 milhões de pessoas da miséria. Será que ela sabe disso!? Bom. Agora sabe.
            A discussão continuou. Troca de acusação. Defesa. Acusação. Um ciclo que se repete muitas vezes. Ela vai embora. Acho que é o fim. O fim de um relacionamento que não havia sequer começado.
            Os dias passam. Eu não esqueço. Ela parecia perfeita. Eu me apaixonei perdidamente. Tão rapidamente. Apaixonado por uma ‘coxinha’. Isso é abominável. Tenho que esquecer. Pessoas vão e vêm em nossas vidas. Tento outros relacionamentos. Nenhum dá certo.
            Em uma tarde, um cachorro vem em minha direção. Ele tem uma coleira. Ouço uma voz. Alguém grita um nome. Deve ser o dono do cachorro. “Liberal”... Quem coloca um nome desse em um cachorro?!
            - Liberal! Liberal!
            Quando me viro, vejo um fantasma. Eu reconheço o rosto. Aquele rosto. Ele pertencia às minhas lembranças. Pertence. Agora, volta para me assombrar. É ela.
            - Você!?- Ela fala, surpresa.
            Entrego o cachorro. O ‘Liberal’. É ridículo colocar um nome desses em um cachorro. Até para um ‘coxinha’.
            Ela perguntou se estou bem. Será que ela se importa mesmo. Ou só pergunta por educação?
            Disse que sentiu saudades. Pensou em mim. Não faz tanto tempo. Ela não havia me esquecido?É. Pode ser que sim. Um  mês não é tanto tempo. A paixão ainda vive dentro de mim. Mas...É possível se relacionar com uma pessoa que têm ideais completamente diferentes dos seus? Não pode ser.
            Um mês. Foi naquele mesmo dia que Temer assumiu a presidência. Um mês que “o país se livrou dos corruptos”. Não consigo me conter. Tenho que falar.
            -E então!? Faz um mês que a gestão de seus políticos começou. Onde estão as melhorias imediatas que ocorreriam?
            Silêncio... Um longo silêncio...
            -Apenas homens ocupam o cargo de ministros. De ‘rei da soja’ a condenado por desvio de merenda. Sete citados na Lava Jato. Jucá caiu na segunda semana. Só havia apoiado o processo para bloquear a Lava Jato. É. Acho que não era “contra a corrupção”...
            E o pau cantou novamente.
            Pablo Messias


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