
A vizinha a vida é falar: “Ah! Sua filha deveria sentar
direito. Ela fala muito palavrão.” E o que é que tem? Porra! Eu quero saber por
que eu não posso sentar do jeito que eu quero, falar como acho que devo. Por
acaso ela paga as minhas contas? Fala tanto da minha vida e não observa a filha
que todo dia cega com ronchas no corpo de apanhar do marido.
Juliana, a filha da vizinha. Uma moça muito bonita,
estudiosa. A gente sempre costumava sair para festinhas. Até ela conhecer o
Ricardo. Bonito, atraente. Prometia coisas lindas, uma vida perfeita. Um final
feliz... Só que não. Depois que Juliana fez a loucura de se casar com Ricardo,
viu que tudo que ele prometera era uma grande mentira. Ricardo agora só queria
casa, comida e roupa lavada. Nada de cursinho. Mulher minha fica em casa
cuidando da comida e lavando a louça. Para que estudar, se lugar de mulher é na
cozinha? Nada de ficar saindo para conversar com amiga. Sem essa de falar alto.
Mulher minha sabe que quem manda em casa sou eu! E se eu pergunto: Juliana, por
que você não frequenta mais o curso? E esses machucados? A resposta é sempre a
mesma. Não é nada, tropecei e bati na porta. O Ricardo não gosta que frequente
o curso.
Mas é isso que é o certo? Eu tenho que lavar, cozinhar,
passar, apanhar para ser uma boa mulher? Eu não! Eu que não vou acabar como
Juliana. Levar grito e apanhar de macho. Eu que não vou me submeter a isso. Eu
quero é que se foda a vizinha e seus pensamentos ridículos de que mulher tem
que falar direito. Tem que ficar em casa. E ainda tem que achar bom, viu ?
Porque se reclamar ai... ai... mulher não pode alterar a voz não. Mulher te que
ser bela, recatada e do lar. Ou então é vagabunda, puta. É isso mesmo.
P-U-T-A!
Porque mulher direita não sai, a não ser que vá ao
mercado comprar alimentos. Mulher direita não fala palavrão. Não fala alto.
Mulher direita te que sentar, baixar a cabeça e calar. Por que quem manda na
casa é o homem. Seu dever é só cuidar da casa.
Quem ela pensa que é para me dizer como devo ser, só
porque ela é esculhambada pelo marido que chega às quedas de bêbado em casa, eu
tenho que ser também? Tenha santa paciência! Eu mesma é que não vou ouvir grito
de homem.
Eu vou ser bela sim, mas do meu jeito. Na minha
concepção. Não da maneira que essa sociedade machista pensa que devo ser. Eu
vou ter emprego sim. Eu vou sair. E macho que achar ruim que vá embora. Nunca,
nunquinha que euzinha aqui vou depender de homem.
Eu vou sair para onde eu quiser. Se quiser usar batom
vermelho, eu vou usar. Se eu não quiser voltar para casa no mesmo dia, eu não
vou voltar. Se eu quiser dormir com alguém no primeiro encontro, eu vou dormir.
E pode me chamar de puta, dizer que me cura com porrada o que quiser!
E eu não preciso de cura nenhuma. Quem precisa de cura é
seu preconceito por achar que mulher não pode ser o que ela bem quiser.
É isso que você chama de ser uma boa menina? Diz minha
mãe. Olha aqui! Quem foi que disse que eu quero ser uma boa menina? Eu quero
ser má. Eu prefiro ser uma menina má. Porque se, para ser boa, eu preciso viver
à mercê de alguém, eu quero ser é muito ruim mesmo.
Deanne Dias
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