segunda-feira, 11 de julho de 2016

Minha amiga

É a do dia. O gosto amargo da preferida. Tão gostosa, me seduzia. Ei, rapaz! Vem cá! Traz mais uma garrafa. Da mais forte que tiver, por favor. Eu espero. Minha boca já secou. Quantos minutos já passaram? VAMOS, MEU SENHOR! Estou a esperar. Essa maravilha chegar. Já sinto um mal-estar. Lá vem ele, resmungando: “Só se passaram dois minutos!”. O cara da outra mesa só ri e o tempo todo só faz repetir: “Só podia ser esse bêbado nojento”. De quem será que esse cara está falando? De mim não pode ser. A pinga é minha amiga. Melhor amiga. Bêbado eu não sou. Nunca fui. Qual o problema de beber? Todo mundo bebe. O (A) presidente bebe. O juiz bebe. Até o papa bebe! Qual o problema afinal? Vocês não conseguem entender. Com vocês não deve acontecer. Só de sentir o cheiro já me vem o desejo. Isso desde que minha mãe morreu. E aí, aconteceu. Minha vida acabou. Tudo desmoronou. Meu céu despencou. O chão não me segurou. Eu perdi minha mãe. E a bebida, minha amiga, me ajudou. Katharina não entendeu. Me largou, me esqueceu. Foram só algumas vezes. Eu juro. Algumas noites ébrio. E ela me largou. Nem o número de telefone deixou. Nem o endereço novo me falou. Nunca mais soube dela. Oito anos de casados. E tudo acabou. Só por causa da pinga. Só ela me ajudou. O luto ficou. A dor das perdas não acabou. Só a pinga me abraçou. Nem perguntou quem eu sou. Nem mesmo Katharina fez isso! Por que ela me abandonou? Bem, pouco importa. A amizade com a pinga continuou. Há meses só me animou. Me levou para bares e me enturmou. Uma, duas, sete mulheres em uma noite ela me arrumou. Pra que Katharina na minha vida, se tenho mulheres, bebida e alegria a meu favor?
Mais uma garrafa voou. E a noite mal começou. GARÇOM! GARÇOM! Pelo amor de Deus. Traz mais duas, por favor. Ele me olhou. Revirou os olhos e foi em direção ao gerente. Que tipo de bar é esse? Demora séculos para nos trazer nosso amor. O gerente me puxou. Para a saída me levou.
- Olhe aqui, seu bêbado inútil! Você já está por aqui de dividas comigo! Vá para onde meu olho não possa te ver, senão a porrada vai comer!

Ele me jogou. A calçada me segurou. Filho da puta! Você vai se arrepender! Se Katharina estivesse aqui, não deixaria acontecer. Vou-me embora. Em casa deve ter mais amigas para me alegrar. Foi difícil chegar no carro. Foi difícil até ligar. Aquele diabo vai pagar! Uma vergonha dessas nunca mais irei passar. Que humilhação. Eu só queria me distrair. Até isso querem tirar de mim. Minha boca voltou a secar. O carro não para de acelerar e faróis vermelhos ultrapassar. ESPERA AÍ! Não pode ser. Deus não faria isso comigo, ou faria? Aquela é Katharina? Na esquina? E quem diabos é aquele cara? E ele também tem uma amiga. Ele está com minha Katharina!  Isso não vou tolerar. Antes de tomar qualquer atitude, escutei um barulho assustador. Imediatamente a luz apagou. Senti meu corpo no ar e depois uma batida grandiosa no chão. Será que Katharina viu? Será que se importou? Dessa vez, nem a pinga comigo ficou. Agora só via uma luz muito forte, que tomou conta da minha visão. Nunca mais apagou.

Yasmin Souza 

Nenhum comentário:

Postar um comentário