Casal de fundo de
porta-retratos recém- comprado, sorrisos sinceros, lugares exóticos, alegria
estampada em cada traço do rosto. Papel rasgado diante dos meus olhos, quando a
moldura já não aguentava mais tantas mentiras.
- Nossa, Diego, acho que
você engoliu um livro de filosofia com Aristóteles e tudo.
- Mas foi assim, Mônica.
Ainda não me conformo com tanta discórdia. Ela deveria ter me contado.
O culpado disso tudo foi
você...
Diego sai do sofá e foge
para o quarto. Deitado na cama, olha para o lençol e vê uma mancha do chocolate
derramado naquela noite em que passara a madrugada inteira jogando e comendo
besteiras com Beth.
Ela sempre foi a mulher dos
seus sonhos. Certo dia, em uma festa de 15 anos de sua prima, Diego conheceu
Beth e se encantou pela primeira vez em que fitou seu sorriso. Depois de muitas
conversas, eles se tornaram amigos íntimos, e Diego começou a se embaraçar pela
garota. Beth, embora gostasse muito dele, nunca pareceu demonstrar nada além de
amizade, mas sempre o tratou com muito carinho e atenção. Porém, um dia, Diego
pediu ela em namoro com uma declaração genial, e ela, deslumbrada diante
daquela cena, aceitou. Mas fez isso apenas da boca pra fora.
O que posso fazer por você,
meu benzinho? – pergunta Mônica, entrando no quarto com uma voz meiga.
- Nada... não sei mais o que
fazer. Poxa, Mônica, se ela queria apenas a minha amizade não deveria ter
aceitado meu pedido de namoro. Eu tinha tanta certeza que ela gostava de mim...
- Talvez goste de você, mas
seja burra demais pra reconhecer isso. De qualquer forma, você sabe que pode
contar comigo pra o que precisar. Tudo mesmo.
Obrigado, Mônica. Só não
quero que ela saiba que estou sofrendo. Quero mostrar o contrário do que ela
pensa sobre mim.
Diego pensa um pouco sobre
si e reflete sobre suas atitudes, mas por um momento, começa a observar Mônica,
que estava deitada no sofá à sua frente, lendo um livro de ficção com uma capa
bem interessante. Silhueta bem definida, pele rosada, coxas medianas, cabelo
preto azulado, nariz afilado, e uma pequena mancha no braço. Mônica era uma
garota moderna que sempre se vestia bem.
Diego, embora distraído,
observava seus modelitos e, numa visão geral sobre ela, questionava para si
mesmo o porquê de ela nunca aparecer com algum namorado. Por opção, talvez.
Quando queria perguntá-la, não sabia como abordá-la e pensava em outra coisa.
De qualquer forma, Mônica era uma garota muito atraente.
- Hm...veja bem, você é
muito bonita. Bem que poderia me fazer companhia na confraternização de sábado
à noite – fala Diego, como se fosse um comentário descontraído qualquer, mas
com um convite em aberto.
Mônica inicialmente não
gostou muito da ideia, mas viu que seria uma boa oportunidade de tentar fazer
Diego esquecer aquilo tudo.
Desde que o conheceu, nos
estágios do curso de gastronomia, sempre sentiu uma leve atração por ele e
gostava de ficar observando-o passar pelos corredores da cozinha com seus
pratos majestosos, todas as vezes soltando elogios e parabenizando-o.
Diego sempre foi “mão cheia”
para cozinhar, e Mônica, era a degustadora oficial de suas novas criações.
Porém ela não estava naquele dia para provar um novo prato francês ou uma nova
sobremesa, e sim para ouvir os seus lamentos.
Mônica era do tipo amiga,
conselheira e companheira. Se Diego estava em um lugar, Mônica estava por
perto. Ela sempre fora motivo de briga entre Diego e suas namoradas, uma vez
que, nenhuma delas aceitavam a sua intimidade com ele.
- Não és o primeiro que me
elogia, Diego. Como seu convite foi tão brega, vou pensar na sua proposta. –
Mônica quis dizer sim.
Chegando no sábado à noite,
Diego vai de carro até a casa de Mônica e fica aguardando por um longo tempo. A
rua estava bem movimentada naquela hora. Luzes, carros, pessoas e uma boa
música no player do carro, deixava Diego enérgico e ansioso.
Quarenta minutos depois,
Mônica sai com um visual deslumbrante. Vestido preto, discreto e elegante, com
detalhes dourados que harmonizavam com sua carteira de mão.
Diego sai do carro e abre a
porta para ela, mas não porque ele era um cavalheiro, bom, talvez, mas somente
pra, de forma hilária, demonstrar para ela que estava encantado com tamanha
beleza.
- Diego, que calças
horríveis são estas? Pegou do seu avô?
- Desculpa se não estou à
sua altura, rainha da Inglaterra. Posso me socializar um pouco?
- Você está bonitinho, falta só
um babador.
Mônica dá umas risadas.
- Ah, que ótimo! Vamos logo.
Sua pré-produção me custou 20 minutos de atraso. Será descontado na próxima.
Os dois vão conversando
muito durante a viagem. A música, os sorrisos, as conversas, criam um clima bem
divertido entre o casal. Diego, por um momento, se desprende do mundo e começa
a perceber que Mônica tem lábios muito sedutores. Estranha por nunca ter
sentido aquilo antes, mas isso pouco importava. Em um semáforo, no meio do caminho,
puxa seu smartphone do bolso e tira uma foto com ela.
Eles ficam observando a
imagem por um momento, olhando um para o outro, sorrindo. E, em um determinado
segundo, se atracam em um beijo estranho, daqueles sem intenções no primeiro
instante, mas que vai criando sentido nos segundos seguintes.
Chegando ao local da
confraternização, Diego reconhece os amigos de longe e cumprimenta-os antes de
entrar. Mônica, agarrada no seu braço, dá apenas alguns sorrisos diante das
perguntas do tipo - “namorada nova?” – ouvindo como resposta - “Não, não.
Apenas uma amiga”.
A casa do seu amigo Rubens
era muito grande, e sempre era escolhida para a confraternização semestral da
empresa na qual Diego trabalhava.
Entrando na sala, ele fez
uma varredura visual do lugar, reconhecendo todos que estavam ali. Na poltrona
do canto esquerdo, estava Beth, sentada de pernas cruzadas. Ela estava muito
diferente: cabelos com mechas, levemente ondulados nos ombros, mais magra,
sobrancelha bem feita; parecia mais vaidosa. Diego procurou não olhar muito,
mas compensou tudo em seus pensamentos.
Mônica fez exatamente a
mesma coisa, entretanto, ao ver Beth, criou um leve receio de que Diego fosse
ter alguma recaída. Apertou seu braço e o puxou para a cozinha, onde estava uma
amiga que reconhecera assim que entrara na casa.
- Mônica, você por aqui!?
- Michele! Não sabia que
viria. Onde está o Emanoel?
- Lá atrás, preparando o
churrasco... Diego, é bom te ver também!
- igualmente, Michele – responde Diego, um pouco tímido – Vou aqui tomar
um ar. Deixarei vocês duas conversando. Volto já.
Mônica se irritou consigo
mesma, mas não pôde evitar que Diego saísse. Michele gostava muito de
conversar, e Mônica não tinha coragem de interromper a conversa.
Lá fora, Diego sentou na
cadeira que tinha no terraço. Havia muita grama e algumas roseiras fazendo o
contorno do espaço.
Mais à frente, tinha um
dálmata preso numa casinha, e a vasilha de ração parecia vazia há muito tempo.
Ao olhar de lado, avista Beth.
- Você está namorando a
Mônica?
- Beth? Resolveu falar
comigo?
- Desculpa, Diego, eu fui
idiota contigo. Precisava de um tempo sozinha e, nesse tempo, percebi o quanto
você me faz falta.
- Um pouco tarde, não?
- Não sei. Quando soube que
viria, fiquei muito ansiosa para te ver. Achei que seria um bom momento para te
pedir perdão.
- Você não imagina o quanto
eu sofri, Beth. Você me deixou sem pensar duas vezes. Não se preocupou comigo
em momento algum. Te esperei por semanas e você nem respondeu minhas mensagens.
E quando eu finalmente supero tudo isso, você vem me pedir pra voltar?
Beth interrompe Diego e
rouba-lhe um beijo. Na mesma hora, Mônica flagra os dois e fica paralisada por
um instante. Quando Diego abre os olhos e percebe a situação, empurra Beth.
- Mônica, me desculpa! Eu
não queria...
- Chega, Diego! Eu deveria
saber que você faria isso mais cedo ou mais tarde. Mas jamais imaginaria que
fosse justamente hoje! Arma de vingança? É isso que eu sou pra você, Diego? Eu
me ofereço pra cuidar de você e é assim que eu sou retribuída?
- Mônica, você entendeu
errado...
- Nada disso. Entendi, e
muito bem! Você sabia que ela viria e me convidou mesmo assim. Muito obrigada,
Diego. Só espero que você seja feliz.
Mônica sai apressada do
terraço e foge para a rua. Diego tenta ir atrás dela, mas Beth o segura e pede
pra ele ficar.
No mesmo instante, um
barulho de estilhaços ecoa. Todos saem correndo para ver o que aconteceu. Diego
se desespera, solta Beth e vai até o local.
Mônica havia jogado uma
grande pedra no vidro do seu carro. Diego se assusta com a situação, mas fica
tranquilo por não ter acontecido nada pior. Imagina que um vidro quebrado não
paga a decepção que ela teve.
Embora ele quisesse ter
corrido atrás dela, Beth era seu grande amor. Mônica merecia alguém menos
confuso que ele. Alguém que valorizasse o seu carinho, que desse atenção em
todos os momentos, não só nas horas de solidão. Diego não quis usá-la para
reconquistar Beth, não planejadamente, mas já previa que ela fosse se
arrepender quando visse ele com uma garota bonita, mesmo que fosse sua amiga.
Diego já sabia de tudo desde o começo.
Mônica se foi. Na outra
semana, Beth também. Diego ficou sozinho novamente, mas agora sem Mônica.
Mentira. Essa história não
vai acabar assim. Na verdade ela nem começou.
Diego toma um susto. Mônica
ainda estava na sua frente deitada no sofá lendo seu livro estranho de ficção.
Ele mexe os olhos para os lados, situando-se no espaço, e tentando voltar ao
normal. Mônica, tão meiga e tão gentil, se espreguiça e levanta do sofá. Vai
até Diego e beija-lhe na testa.
- Você está melhor?
- Acho que sim.
- Quer que eu faça algo para
você comer?
Diego fica calado por um
instante. Observa Mônica por um tempo e puxa ela pra cima dele.
- Mônica, Mônica. O que
seria de mim sem você...
Depois de dizer isso, Diego
dá um selinho de leve, mas quando sente o quanto Mônica revira seus
sentimentos, segura ela pela cintura e a beija com todo carinho.
Raddson Ricelle
Jonathan Gabriel
Conto produzido a partir da letra da canção brega Arma de vingança, de Carlos Alexandre.