terça-feira, 2 de agosto de 2016

Massa?

             Ser ou não ser um maconheiro? Eu não tenho essa opção. Desde a minha infância vivi na favela. Isso mesmo. Lá no Mosquito. Nunca me deram oportunidade. Nem de aprender, muito menos de sobreviver. Lá eu sempre fui aviãozinho. Um moleque à procura de comida. Em um país onde dizem que educação é prioridade. Eu não sou prioridade. Me acostumei. Conheci a erva. Nela achei paz. Assim segui em frente. Sem nunca olhar para trás.
            Hoje, algumas pessoas vêm me perturbar. Querem me ajudar. Moço, você precisa de ajuda? Caramba! Eu não preciso de ajuda. E isso não é uma desculpa! Por que precisaria? Vivo de boa. Sorrindo à toa. Sempre consigo comprar comida. Fumar minha massa. Vou querer mais o quê?
            Todo mundo acha que sou fora da lei. Só porque a minha massa é proibida? Dizem que é bom. Dizem que não presta. Não querem discutir. Alguns querem liberar. Mal eles sabem que o meu fumo faz um bem danado. Relaxa, acalma. Faz levitar a alma.
            Eu sou maresia. Como dizia Gabriel Pensador. Só que havia uma velha. Infelizmente, ela morava na mesma rua que eu. Católica roxa. Sempre estragava a minha lombra. Com o seu discurso de amor ao próximo. Queria me levar para uma casa de recuperação. Ela é que precisa se recuperar da sua noia. E me deixar em paz de uma vez por todas.
            Essa lazarenta ficou me abusando. Dia após dia. No final de semana, eu estava relaxando no quintal de casa. Preparei o reggae. A massa estava pronta. Comecei a viajar no aroma da paz. E adivinha quem apareceu? Não foi o Bob Marley. Muito menos um unicórnio cor de rosa. Eu tentei ver quem vinha. Minha vista estava um pouco embaçada. Meu Deus! É o Satanás! Antes fosse... Era a infeliz da velha coroca de novo. Ela me veio oferecendo um terço. Enfie esse terço no... bolso.
- Por que você não vai à minha igreja? Lá vamos te ajudar. Deus é maravilhoso.
- Se quisesse ajuda, teria pedido, não?
Sem querer, aumentei o tom de voz.
- Eu não quero a sua ajuda e de mais ninguém!
E lhe dei um empurrão. A condenada caiu. Bateu a cabeça. No chão. Deu merda. Matei a coitada. A vizinha viu tudo. Logo, chamou a polícia. Fui preso e indiciado por homicídio doloso e tráfico de drogas. Os “home” acharam vinte quilos de maconha lá em casa. Era só pro consumo. Não teve jeito. Fui em cana.
No caminho da delegacia, presenciei um acidente. Uma jovem que bebeu demais atropelou os noivos e o padre na porta da igreja. Veio logo a indignação. O álcool mata tanta gente... E esse caso foi mais um na estatística. O tabaco continua viciando pessoas. Causando câncer. Já viu alguém causar um acidente por causa da erva? Já viu o marido bater na sua esposa por causa dela? Eu nunca vi. Mas por causa dessas outras drogas sim. Quando será que o povo vai enxergar isso? Mas o meu fuminho não pode. “Ele é do mal”. Sistema hipócrita.
Chegando na prisão, eu conheci os criminosos de verdade. Entravam e saíam cada vez mais perigosos pra sociedade.
Um mês na cadeia. Notei algo estranho. Alguns presos estavam se suicidando. Era a notícia que rolava. Será? Todo mês apareciam novos casos. O diretor dizia que era normal. Deu até no Jornal Nacional. Veio uma equipe de reportagem. Gravou toda a situação. Os presos todos amontoados. No chão. Mas o que eu posso fazer? Já estou nessa prisão. Todo dia me vem a revolta. Até quando vou ficar nessa bosta? Quando eu precisei, ninguém quis me ajudar. Mas quando estive de boa, esses hipócritas vieram me atrapalhar. Só me resta esperar. Ansioso. Ao mesmo tempo temeroso. Sempre preso na mesma indagação. Quando chegará a minha libertação?

Adriano Rodrigo

            

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